2 de setembro de 2011

PROFISSÃO ATOR

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

“Parece não se ter ainda sequer pensado aqui que a eloquência e a escritura são artes que não podem ser adquiridas sem a orientação mais minuciosa e a aprendizagem mais penosa.”NIETZSCHE, Friedrich

A função do ator é indiscutivelmente social. Mesmo que o que o mova seja a questão da interpretação e do próprio desenvolvimento de sua carreira, o ator não pode deixar de compreender que a base de todo o seu trabalho está na educação. Na educação formal, que é a que se aprende na escola e, fundamentalmente, na educação do coração, que é de onde trará a generosidade e a precisa compreensão da sua função dentro do seu ofício. Da educação virá a cultura.

O ator depende de seu público para poder levar sua arte à frente. Seja na TV, no cinema ou no teatro, independentemente do veículo, é essencial que sua construção nasça do seu desejo de compreender o todo à sua volta para proporcionar às pessoas o seu entendimento e assim causar as sensações devidas a todos que o assistirem, que o prestigiarem.

A ferramenta básica do ator é ele mesmo. É através de sua capacidade intelectual, da sua maneira de olhar o mundo, da sua posição política, do seu interesse pelo outro, de sua ideologia, do seu conhecimento cultural (teatral, literário, cinematográfico, poético, folclórico) e, principalmente, da sua generosidade consigo mesmo, com a vida e com as pessoas, que ofertará a sua arte de maneira genuína e profunda.

A generosidade está muito ligada à maneira que o ator vê o mundo em que vive. Não são as pessoas ou os acontecimentos que determinarão a maneira de pensar de cada um; é aquilo que está dentro, que é a essência, a alma. Neste sentido, a educação posta agora como educação da alma entra ampliando a visão do ator no intuito de apresentá-lo ao início de sua trilha, que é totalmente voltada para o autoconhecimento para daí sim provocar a devida reflexão e finalmente apresentá-lo, assim como a sua arte, a arte do ator, ao espectador, ao povo, o seu público.

Num país como o Brasil, onde o descaso com a educação e com a cultura é evidente até para os mais leigos, onde os problemas com a saúde, com os empregos formais, com os salários ditos dignos, onde tudo é apenas discurso, o ator entra em cena para lutar contra esse quadro decadente. Entra em cena para fazer a sua parte. Entra sabendo que nada mudará, mas não abre e não deve abrir mão de fazer apenas a sua parte para dormir com tranqüilidade durante a noite.

Um ator que desconhece os problemas de seu país, seu histórico educacional, cultural e social não pode se considerar verdadeiramente um artista genuíno, um ator engajado, em outras palavras.

Essa questão de ator engajado parece ter caído em desuso uma vez que a busca maior é pela glória, pelos quinze minutos de fama, pelas conquistas financeiras, pelo amaciamento do ego por si mesmo e pelas pessoas ao redor. No entanto, a glória some, os quinze minutos passam, as conquistas findam, as pessoas bajuladoras mudam o alvo e quem optou por tal caminho acaba sozinho (a), sem perspectiva, sem a sensação de ter feito algo realmente produtivo a alguém. É uma trilha ampla com um final previsível.

A escolha pela profissão deve ser bem compreendida. Não é fácil ser ator. Não é uma profissão qualquer e não será um ou dez cursos que farão de uma pessoa um ator ou atriz. Todas as ferramentas estão dentro e os cursos apenas servem para que as descobertas aconteçam e as aptidões se revelem por si só.

O caminho ideal é que o aspirante ao ofício tente entender do que se trata e como funciona, o que o move àquilo e, por fim, que converse com alguém que viva nesse universo da arte de atuar, confie nessa pessoa e se entregue ao estudo. A conversa com alguém da área pode ser definitiva, as respostas interiores das questões principais podem ser esclarecidas. Assim a escolha fica mais sincera e os obstáculos deixam de ser surpresas indesejáveis e passam a ser parte do caminho escolhido. É duro, mas se é o que é, vale a pena.

“Nada mostra com mais evidência e vergonha a presunçosa satisfação própria dos nossos contemporâneos do que a indigência, meio avarenta, meio-descuidada, de suas exigências enquanto educadores e mestres.”
NIETZSCHE, Friedrich

0 comentários:

 
Design by Daniel Pweb