18 de setembro de 2011

Piscina de lágrimas (p/ Cris Braun)

 Por Alex Giostri.

O vigor firma a vida
e o poeta ou a sua lenda
bailam isolados no hall;
e no êxtase do verso
expungem um a um.

A noite corre,
a lua altera,
o sol eleva;
o poeta afoga
o anseio de viver.

Ao solo o espectro
da ventana desprezada,
ao firmamento a luz;
ao vê-la o poeta verte
sua piscina de lágrimas.


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Melhor assim (p/ Dulce Quental)

 Por Alex Giostri.

Se a exigência é o silêncio
silencio
Se a voz do vazio é muda
emudeço
Se o lampejo das trevas revela
calo
Se a cura da falta é mágoa
cesso
Se a candura do sonho é ilusão
findo
Se a redenção da vida é mouca
termino.

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O primeiro dia

  Por Alex Giostri.

Que rima linda!

Não eram promessas logradas,
não foi uma quimera aguda,
não fui eu quem rabiscou.

Que rima linda!

Uma harmonia encantada,
dois ávidos lábios,
duas línguas apaixonadas.

Mas que rima linda!

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Na calada da noite

  Por Alex Giostri.

À noite ele fica louco!

Colhe lances suspeitos,
atravessa a orla,
serpenteia bosque adentro,
vagueia areia afora,
invade almas frágeis.

Quando a noite chora, aflige,
quando a lua é cheia, amansa,
quando a noite clareia, sofre
e esquiva-se pelo breu.

Quando desperta está só
suporta o dia só,
reflete só,
reside só.

Mas à noite...
À noite?
À noite, ele fica louco!

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Tarde demais

 Por Alex Giostri.

Após muitos anos conheci o meu vão.
O dia que desvendei o meu castigo
Que silêncio! Apreciei a permissão.

Entranhava-me mais e mais endoidecia
E me desgracei pelas artimanhas da vida.

Não sabia mais nada do nada que sabia
E a perdição de Dorian me carcomeu
E a juventude estranhamente se calou.

Só então o espelho repousou o meu eu
E o que escapou foi um retrato pálido
Que se dissipou no oco do tempo que foi.


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Aquele dia

  Por Alex Giostri.

É singular o que aconteceu ao te olhar:
um encantamento onírico,
uma fantasia admirável,
uma ânsia ardorosa.

É primoroso o que aconteceu ao te olhar:
um naufrágio em água branda,
uma misteriosa impregnação,
uma emoção imponderável.

É genuíno o que aconteceu ao te olhar:
um cristalino calafrio,
uma intuição indefinível,
uma sublime felicidade.

É primordial recitar o que aconteceu ao te olhar:
um violento elã por tocá-lo,
uma surpreendente tranquilidade,
uma inalterável evidência por entendê-lo

Esses os acontecimentos que se deram ao te olhar.

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Lágrimas no coração

  Por Alex Giostri.

Coração fingido que me almeja o chão,
eu cuido de ti como a um irmão
e tu me deixas sempre na mão.

Não me avinagre uma nova solidão;
tu percebes que a luz é em vão
e que o amor é aflição.

Coração casmurro, tu me crias confusão;
o impulso é igual a uma nova estação,
e, como as flores, no inverno murcharão.

Não te nomeie um mouco e monte o florão;
considere o martírio da escuridão,
e saibas que o amar ou o amor
serão sempre lágrimas no coração.

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Palavras (p/ Belô Veloso)

Se tu lastimas no oco
o germe do descaso,
compreendas que nem tudo
é tão grandioso quanto o que
procuras, por pura vaidade.

Nem as próprias libertinas
são capazes de satisfazer
o que tu, por genuína empáfia,
não pôde inquirir.

Não te iludas ao vires o baixar do sol;
é belo e é lindo
mas, assim como tu, é solitário
e aclara o amargo da mudez.

Se tu lastimas o ácido da
cachaça à hostilidade,
saibas que neste terreno
é a oferenda mais doada,
e nem homens mais sábios
se safam do desígnio do porvir.

Não te enganes com as garoas
que lacrimejam lado a lado;
jubilosas emanam o fascínio
de uma brandura cândida,
e derramam em teus ombros
um ardor que não possuis.


Se tu lastimas a ausência da paixão,
vê que o desencanto a fez assim
e por mais que reveles o teu apreço
não a cativarás tal qual à primeira vez.

Não te iludas com as palavras;
são filhas escorridas da fantasia
que bailam por alguns dedos
penetrando a tua frágil essência,
e por mais que te impressiones,
nunca oferecerão o imprescindível.


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Suspiro

  Por Alex Giostri.

Entrego-me ao belo tal qual a vida ao ar.
Confio a ti a falta que não sustive
e a silhueta que não recuperei.

Cedo-me ao belo e abdico do meu eu.
No espelho nunca me vi,
e estou lá, aí, em busca de ti.

Ao belo curvo-me de corpo úmido e alma limpa.
Na alma,
o silêncio do homem que não soube emudecer.
No corpo,
o aroma da dor e o árduo deleite da falta de amor.
Lá Sinto um intenso frio,
não no corpo,
na alma,
na base da alma,
lá, lá, lá na curva do segredo,
sob a calada dos raios,
no recôndito do ego.

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Meio-fio

  Por Alex Giostri.

De nada serve
aqui de baixo
fitar pássaros
e não pairar

Aprendi a admirar,
não a voar

De nada serve
aqui de alto
afrontar ruas
e não enfrentar

Aprendi a admirar,
não a voar

De nada serve
no fundo de mim
notar afeição
e não desvelar

Aprendi a admirar,
não a voar

De nada serve não amar.

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Se tu és...

  Por Alex Giostri.

Se tu és ator,
elucida-te para mim;
diga-me quem és,
e de onde vens.

Se tu queres residir mais vidas,
desabotoa-te para que eu te descubra;
confia-me o que não enxergas,
autoriza-me descortinar-te a alma,
e goza a minha margem.

Se tu és de fato um ator,
deleita sofrendo,
sofre deleitando,
acredita o que nunca acreditou,
devaneia e clama;
protesta por tua natureza
e celebra declamando.

Se tu és um ator,
não te defendas de ti,
não te defendas da casta,
não te defendas de mim.

Se tu queres residir outras vidas,
percebas que é penoso e deserto,
calmo e tumultuado,
pungente e precioso,
e sejas astuto e sonhador.

Se tu és um ator,
se tu és de fato um ator,
atua para mim...


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Relação de Poemas

01 - Se tu és...
Se tu és ator, elucida-te para mim; diga-me quem és, (...) Leia mais

02 - Meio-fio
De nada serve aqui de baixo fitar pássaros (...) Leia mais

03 - Suspiro
Entrego-me ao belo tal qual a vida ao ar. Confio a ti a falta que não sustive e a silhueta que não (...) Leia mais

04 - Palavras (p/ Belô Veloso)
Se tu lastimas no oco o germe do descaso, compreendas que nem (...) Leia mais

05 - Lágrimas no coração
Coração fingido que me almeja o chão, eu cuido de ti como a um irmão e tu me deixas (...) Leia mais

06 - Aquele dia
É singular o que aconteceu ao te olhar: um encantamento onírico, uma fantasia admirável (...) Leia mais

07 - Tarde demais
Após muitos anos conheci o meu vão. O dia que desvendei o meu castigo Que silêncio! Apreciei (...) Leia mais

08 - Na calada da noite
À noite ele fica louco! Colhe lances suspeitos, atravessa a orla, (...) Leia mais

09 - O primeiro dia
Que rima linda! Não eram promessas logradas, não foi uma quimera (...) Leia mais

10 - Melhor assim (p/ Dulce Quental)
Se a exigência é o silêncio, silencio. Se a voz do vazio é (...) Leia mais

11 - Piscina de lágrimas (p/ Cris Braun)
O vigor firma a vida e o poeta ou a sua lenda bailam isolados no hall; (...) Leia mais

12 - Preso
Preso eu fui; preso pela vontade de viver a vida; preso pela ânsia de olhar em seus olhos e dizer  (...) Leia mais

11 de setembro de 2011

O PLANO B DE CADA AUTOR BRASILEIRO

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

Não é de hoje que venho trabalhando com autores. Autores teatrais, autores literários, roteiristas, dramaturgos, autores de poemas nada poéticos, autores de textos banais, autores consagrados, autores equivocados, enfim, seres humanos que por causalidade da vida, por alguma circunstância, que não serei eu a dizer aqui qual foi, optou pelo fazer textual, seja lá qual o seu destino, a sua bitola, como se diz no cinema. Talvez a palavra opção não seja a melhor, pois há os que não tem outra senão o escrever, o que invalida o tal livre-arbítrio neste sentido e o põe na posição de necessitado, de um homem (ou mulher) que não conhece o mundo senão sob o olhar de suas palavras, que necessita e se salva no mundo das palavras, o que, aqui, na realidade, não nos importa, menos ainda se escreve bem ou mal. Não nos cabe um julgamento de valor, um critério se isso ou aquilo é bom ou nos agrada enquanto leitores.

O fato é que há autores espalhados pelos quatro cantos do país. Novos, velhos, jovens, idosos, rapazes, meninas, pessoas que são o que poderíamos chamar de a reciclagem do que se diz literatura. E o que é a literatura? E o que ou quem são essas novas pessoas? O que querem?
Naturalmente, alguns querem levar seus discursos adiante, mostrar ao que vieram e ampliar os seus universos aos universos de seus cobiçados leitores, outros querem se salvar de si mesmos, vomitar na tela do computador tudo aquilo que não são, ou o que são, ou o que querem ser e não conseguem. Há também os deslumbrados que querem ficar famosos, reconhecidos internacionalmente, assediados pelos pedestres nas ruas, enfim, há de tudo, como em qualquer ramo profissional.

Independente do objetivo de cada um, que é a única coisa que não nos importa aqui, cada escritor, e eu me incluo nesse pacote, quer sobreviver de seu ofício, de suas obras, de seu campo de pesquisa.
Para isso, há de se ter uma enorme coragem. Sim, coragem. Não está no mérito o talento de cada um. Talento é á ultima característica que é vista. Há de se ter uma enorme coragem para dizer para si mesmo que o que quer se tornar é um escritor, mesmo aqueles que dizem não terem escolha – a sua não escolha, torna-se também uma escolha -, mesmo esses, todos; há de se ter coragem para encarar a vida com uma tela de computador, um teclado, um mouse e idéias na cabeça. Há de se ter coragem para perder um ano e escrever um livro, sem saber se o resultado será satisfatório, se corresponderá às próprias expectativas, se toda a pesquisa feita sobre o assunto tratado na obra será bem direcionada, se os conflitos que entrarão no enredo serão bem conduzidos, se os personagens ficarão verossímeis, mesmo se a verossimilhança pretendida seja uma inverossimilhança quando postos numa balança de peso e medida no campo da vida real, se o tempo pretendido dentro da obra será bem delineado para absorver toda a narrativa imaginada, há de se ter coragem. Mas não acabou. Com a obra pronta, há de se ter coragem para encarar a vida e as portas nas caras das editoras que quando muito, dizem: não, muito obrigado, volte amanhã. E há de se ter coragem quando, depois de três quatro anos da obra escrita, alguma alma generosa interessa-se pela obra e a publica. Está tudo resolvido. Não. É aí que começam os novos problemas, as novas agonias, as novas investidas no há de se ter coragem. Uma vez publicada, uma obra deve ter toda uma assessoria de imprensa. A assessoria de imprensa só se levantará de sua cadeira se o autor tiver alguma evidência na mídia, se for notícia, ou se a editora tiver um poder de compra muito alto. Uma vez assessorado, o autor então começa a frequentar os programas de TV, de rádio e colunas literárias, tudo para que o seu livro alce vôo e saia como pássaro das livrarias, direto para casa dos futuros leitores. No entanto, a obra não sai. E por quê? Mas como, se foi tudo feito tão minuciosamente? Ninguém lê? Ninguém compra? Sim, naturalmente sim. Mas não o seu livro. Não o livro do João das Couves que chegou ontem. E essa é a realidade nua e crua, sem demagogia. Nem mesmo o poder de imprensa fará com que um livro seja vendido assim, de uma hora para outra. Há de se ter um gancho, há de se ter coragem para continuar tentando.
Aí então, o escritor, inconformado, depois de lamentar a sua existência sobre os pacotes de seus livros na sala de sua casa, passa para o plano B. Arruma um emprego num banco, vai trabalhar numa loja de shopping, vira balconista, faz faculdade de odontologia, de direito, casa-se com alguém que o financie, endivida-se num banco, ou então, respira fundo e passa a mais uma pesquisa, para uma nova obra, dessa vez a infalível, a que o tirará do fundo do poço, da lama. A palavra mais adequada a isso tudo é a persistência. É dela que se frutificará o alicerce sólido de cada escritor. É dessa persistência que será arrancada a sede de querer conquistar os próprios ideais, os sonhos realizados e o próprio sustento. Agora, essa persistência é muito dura de ser enfrentada sozinho.
Um escritor lutando sozinho não terá forças o suficiente. Mas isso é para qualquer ideal, como uma frase clichê que nem me lembro de quem é, mas não é minha que diz “que um sonho sonhado sozinho não é realidade”. Isso numa reflexão superficial já nos apresenta escancaradamente que o há de se ter coragem tão dito ao longo do texto significa que é fundamental que todos tenham coragem de permanecer no campo de batalha e que todos, principalmente os novos e idealistas, tenham sua força na força do outro, que se amparem e juntos formem o que está por vir, o que será... que é o que a literatura dita clássica hoje já foi; um dia ela também foi o que será, e pelos mesmos jovens que ontem eram cada um dos novos escritores de hoje e que hoje são tudo aquilo que os novos escritores, os reais novos escritores, querem para si, o ser apenas um escritor, reconhecidos e respeitados como tal, sobrevivendo modestamente e com dignidade de seu ofício, sejam indo pelo plano B ou não, mas juntos e unidos, sempre, ao longo da vida. Nunca sozinhos.

10 de setembro de 2011

Travesti - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

A figura do travesti por si só já é uma causadora de polêmica. É, na mesma medida, adorada e desprezada; sua presença geralmente causa curiosidade, provoca discussões de todo quanto é tipo, desperta o lado moral e amoral de quem olha, altera o emocional, principalmente dos homens.

O travesti é um travesti. É um indivíduo do sexo masculino que num determinado período de sua vida, sabe-se lá por qual motivo – e podem ser inúmeros, assim como para qualquer transformação na vida – transformou-se num ser de aparência feminina, buscou, no decorrer de sua transformação, a feminilidade, espelhou-se definitivamente na mulher.

Engano ingênuo o ator ou pesquisador que aproximar o travesti do gay. O travesti é aquele que corteja a mulher de modo tão pleno, que opta por transformar-se numa. É também um ser do sexo masculino que mantém relações homossexuais, no entanto, é um ser do sexo masculino transformado num alguém de aparência feminina. Sua relação com a vida é bem distante da do gay comum.

Basta um olhar mais atento, para perceber que o trejeito do travesti é enriquecido com a delicadeza da mulher. O interessante dessa busca – do travesti pelos trejeitos femininos – é que, ao imitar, ou tentar aproximar o andar da mulher, por exemplo, o travesti, por ser, antes um ser do sexo masculino, conseqüentemente, um ser com mais virilidade, com uma musculatura mais enrijecida, passa do delicado feminino à busca da delicadeza.

Tal busca, naturalmente, não é totalmente alcançada, uma vez que todo o contexto físico do ser do sexo masculino é oposto ao da mulher. E é essa a busca ideal de se pensar. Essa relação física. A maneira que anda um travesti sobre um salto, a voz do travesti, as mãos do travesti, a busca pela maciez dos detalhes da vida.

Uma dica para um ator que queira construir um travesti é que passe a olhar as mulheres da rua cobiçando-as, com olhos de observador e não com olhos de homem desejando a mulher. Ela não poderá ser mais a gostosa que passa, mas sim o próprio objeto de cobiça, não por ela, mas por sê-la. O ator deve querer ser a mulher que vê. Com isso, o travesti que não está dentro, aparecerá como se dentro estivesse. E aí sim começam os trabalhos, a lapidação.

É importante que o ator ou o pesquisador tenham em mente que o travesti é um ser humano como outro qualquer, e que não se trata de um folclore, de uma alegoria. O olhar da busca deve ser sério, sem desmoralizações. Toda a intenção definirá a qualidade do trabalho.

Quanto à postura agressiva e deselegante de alguns dos travestis, o pesquisador e o ator podem pensar sob a ótica da lei do ataque e da defesa. O travesti que se torna alvo de chacota aprende da vida que quem pode mais chora menos e parte para o ataque, seja físico, ou mesmo em xingamentos etc.

Quanto à busca dos conflitos internos, é interessante de se pensar na questão da identidade. Ora, um homem que dorme mulher e acorda homem, com o pinto duro. Um homem que à noite deslumbra e de dia repudia. A questão dos conflitos internos cada um de nós deve pesquisar e definir o que pensa sobre o assunto. Não adianta esperar ouvir essa parte de conflito interior dos travestis. A maioria não admitirá o sofrimento. Entra aí a questão da negação. Uma outra ferramenta para ser estudada.


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Tarado - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

O tarado sexual, o maníaco (que é o caso aqui) é também o compulsivo por sexo. Na maioria dos casos o tarado também já foi vítima, mesmo que indiretamente (simbolicamente), de uma agressão física sexual. O outro passa a ser o seu objeto de desejo e nele, no outro, o algoz, que é o tarado, deposita todo o seu ódio metamorfoseado de prazer, de gozo.

Mesmo que o agressor mantenha uma relação estável na vida, que seja casado, com filhos, o que é muito comum em casos de estupradores e maníacos, mesmo assim o que o move é um ódio doentio pelo outro, uma necessidade de controlar perversamente a sua vítima; o agressor sempre necessita de uma nova vítima.

Na realidade, conviver com tais sentimentos atormentam o agressor, que vê na vítima uma maneira de livrar-se de tudo que sente. Seu prazer (que é o “esgotamento” de seu conflito) está no constrangimento das suas vítimas no ato da agressão.

Para a construção de uma personagem tão sombria como o maníaco, o tarado, o ator deve ater-se aos olhos, à postura e às mãos.
O sexo para o tarado é sujo, é pecaminoso. Essa é uma das razões pela qual “pune” as suas vítimas. O que o move é o que ele mesmo sente, mas ao puni-las, as suas vítimas, o agressor fantasia inconscientemente um espelho. Transfere a sua dor. Isso lhe dá prazer (que é o ódio fantasiado).

Vê-las sofrendo com o que está acontecendo passa a ser o seu gozo e consequentemente a morte daquilo que ele também abomina.

Com isso, o agressor deposita simbolicamente o seu conflito na vítima e esvazia-se do ódio momentaneamente. É uma patologia. Há muitos casos públicos de maníacos. Pesquisar.


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Suicida - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

A primeira observação é a de que uma pessoa suicida sente-se só, independente de onde estiver. Sua postura é autopiedosa; não encontra seu devido valor.

Um suicida em potencial é aquela pessoa que pode se matar. O que a leva ao suicídio é, ou algum problema real do momento em que vive, ou então uma enorme incapacidade de se afirmar socialmente (importante compreender que o afirmar-se socialmente é algo da cabeça do próprio suicida – não é o que é de fato, e sim o que essa pessoa acredita que seja).

Geralmente o suicida antecipa sua ação. Nunca diretamente, mas sempre com frases de efeito como “eu não consigo me dar bem”; “eu não presto mesmo”; “eu não sirvo pra nada”; “ninguém me quer”, entre outras.

Estatisticamente é provado que 80% das pessoas que anunciaram sua morte mataram-se e a maioria anunciou de modo indireto, com as frases postas acima.

É complicada a construção dessa personagem, no entanto, se o ator sabe que sua personagem irá se matar capítulos à frente ou no meio do filme (ou peça) é ideal que vá dando aos espectadores dicas indiretas sobre sua futura ação. E também que demonstre um lado sombrio, uma dificuldade em se relacionar, estabelecer vínculos muito concretos com outras pessoas.

O indivíduo com tendência ao suicídio pede indiretamente para ser acolhido. É um ser que necessita de acolhimento. E em momento algum está interessado em falar sobre a questão do suicídio. É algo que não suporta, pois quer ser visto como individuo e não como problema. Se alguém o ver como a um problema o tiro sai pela culatra e ao invés de ajudar, essa pessoa está atrapalhando.

O ator “suicida” necessita de atenção, zelo, compreensão e afeto. E todas essas necessidades devem ser apresentadas pelo próprio ator, que é quem estará desenhando essa personalidade suicida. Para apresentá-las é ideal que as desenvolva em gestos, falas, olhares e posicionamento corporal. Há inúmeras maneiras de o ator comunicar que irá se suicidar.

O grande mérito é que o ator assim o faça sem que a platéia/espectador note diretamente a sua intenção. A idéia é que ao cometer o suicídio as peças se unam. Isso, naturalmente, no campo da ficção.


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Romântico - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

Pensar uma personagem romântica não é nada complicado. O romântico é aquele ser que acredita nos seus ideais, na honestidade do outro, na sua capacidade de amar e ser amado.

A construção de uma personagem romântica deve ser pautada pelo amor, naturalmente. Pela visão de mundo cabida a personagem em questão. Um homem que ama loucamente uma mulher e que nela encontra sua razão de viver. E uma mulher que encontra o grande amor de sua vida, que aposta no seu amor e na sua felicidade ao lado de seu homem.

O autêntico romântico é aquele ser que está bem consigo mesmo, que tem a sua vida resolvida, que sabe das suas qualidades e defeitos e que vê no amor uma possibilidade de crescimento, de construção, de união. O romântico quer dividir as suas conquistas, as suas dúvidas; quer compartilhar o mundo ao lado do ser amado.

A busca pelo personagem ideal é simples. É através do afeto e da generosidade. O que não pode acontecer é o ator tropeçar na vala comum e transformar o seu trabalho numa estrutura piegas.

O romântico não é piegas nem brega, mas está a um fio fino disso. Essa é uma das armadilhas na hora da construção da personagem romântica. O fundamental para o acerto é a balança e a sensibilidade.


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Ninfomaníaca - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

Uma personagem ninfomaníaca é muito interessante de se conceber. Geralmente personagens ninfomaníacos são femininos. Mas há a ninfomania no homem, naturalmente. Mas no homem é logo taxado de promiscuidade.

A ninfomania é a busca compulsiva por sexo. É o prazer insaciável. É a dependência por relações novas e fortuitas. O prazer na ninfomania é o menos importante de se pesquisar para a concepção. O interessante é tentar entender o que leva a personagem à busca, ao querer o inesperado; é interessante tentar buscar a raiz disso tudo e, fundamentalmente, tentar entender a falta que a move àquilo que busca incansavelmente.

A personagem ninfomaníaca, por mais que esteja atrelada ao gozo e ao prazer, o que a move realmente é a escravidão e a punição. Punição de algo que não sabemos e, possivelmente, nem ela mesma.

O que busca, na realidade, não é a pessoa nova, mas a sensação antiga, a excitação guardada numas das caixinhas de emoções; a ato repetitivo não é uma busca pela novidade, mas sim um círculo vicioso pelo já vivido e concretizado internamente. Sob essa suposição, pode-se pensar, inclusive, que na busca pelo outro, pelo objeto sexual, o que está em jogo não é o outro, mas a sede de uma satisfação interna. Como se o outro se transformasse em mero passatempo, um brinquedo novo.

Se o ator quiser ir além, que vá pelas questões dos motivos primários que levaram tal personagem à ninfomania. Uma ninfomaníaca pode ser apenas uma pervertida. Neste caso, é ideal que se busquem dados da perversão e de suas redes de ligamento emocional.


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Neurótico - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

O neurótico que conhecemos é aquele homem com os nervos à flor da pele. No termo psicanalítico a neurose é uma doença emocional que produz inúmeros sintomas, todos repletos de uma ansiedade incontrolável.

A neurose está atrelada a uma maneira de a pessoa agir e reagir na vida. Geralmente as ações e reações dessa pessoa são muito singulares e muito distantes das atitudes mais convencionais, aquelas mais facilmente reconhecíveis e aceitáveis por toda a sociedade.

O neurótico da ficção não deve representar temor. Suas atitudes no máximo serão auto-destrutivas, o que não prejudicará ninguém a não ser a si mesmo.

O neurótico na ficção pode ter se tornado neurótico por inúmeros motivos e o que o diferenciará e o direcionará para o drama ou para a comédia será realmente a causa e a maneira que reagirá sobre a situação.

O ator que quiser construir uma personagem neurótica com detalhes singulares e com requinte deve procurar, mesmo que subjetivamente (o que é mais provável), a causa da neurose. Através da causa é que se desenhará uma reação e a maneira de agir no decorrer da narrativa.

É fundamental que o ator faça uma breve pesquisa de campo para compreender um pouco mais sobre as neuroses e seus sintomas.


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Mendigo - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.


A representação de um mendigo à sociedade é ambígua. Aparentemente um ser desprezível, o mendigo também é adjetivado de coitado, fracassado, perdedor. A vala comum de quem constrói um mendigo na ficção é o homem de roupa suja, sujo, de barba por fazer, mal vestido, fedido, bêbado e de fala errada.

De fato, um mendigo na vida real tem a questão do álcool bem próxima de seu universo. Até porque no caso do mendigo, o álcool, além de um belo companheiro para a solidão, faz com que os problemas de ordem concreta, sejam esquecidos e trocados por momentos de embriagues.

Segundo uma pesquisa da USP (Universidade de São Paulo), pela Faculdade de História, 80% dos mendigos são homens com alguma formação. Todos entre 30 e 50 anos. E o mais intrigante é que 90% deles já tiveram casa, emprego fixo e família.

A partir dessa informação, o ideal é que o ator/pesquisador procure saber um pouco mais de seu mendigo. Que tente saber subjetivamente, ou mesmo através de pesquisas de fatos reais, em qual circunstância esse mendigo construído se tornou o que é.

Um caminho fundamental também é a questão do mergulho, mas não no ator; na personagem. Também pensar nas questões práticas da vida de um mendigo, como, por exemplo, a busca por um banheiro, por um prato de comida, por um papelão para dormir, por uma marquise.

É fundamental que se pense tais privações, essa brutal realidade. E que se pense sob a ótica do próprio mendigo. Do que sente o mendigo ao ter essa vida.

É imprescindível que a pesquisa passe pelas questões da auto-estima, pela repulsa, pelo medo e pela condição social de cada um.

Um mendigo pode ser qualquer um de nós amanhã. É uma realidade social.


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Jogador - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

O jogador em questão é o jogador compulsivo. Aquele que joga até o que não tem. O que põe em risco o patrimônio familiar e acredita que na próxima partida retomará pra si tudo que perdeu.

A compulsão pelo jogo é maior que a vontade de não jogar. Mesmo na lama o compulsivo irá ao local de jogar e apostará ainda mais. É uma adrenalina destruidora que o mantém esperançoso. O jogador perdedor nunca se vê assim. Sempre que perde tudo é porque o dia não foi bom. A causa do infortúnio nunca é a dele.

Há inúmeros motivos para que uma pessoa torne-se um jogador compulsivo. Há os homens ricos que jogam alto e podem manter essa atividade, no entanto, há os que procuram o jogo como uma maneira de reverter suas situações financeiras, que geralmente não andam boas. Os da segunda opção são os mais freqüentes. E tais homens costumam falir e à sua família. O jogo torna-se mais importante que tudo.

Uma dica interessante é o livro “O jogador” de Fiódor Dostoievski. A novela (literária) é a própria experiência do escritor (romanceada) com a compulsão pelo jogo.


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Frígida - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

A frigidez é a ausência da libido. Uma mulher frígida provavelmente possui a auto-estima baixa. A perca da auto-estima pode se dar por uma traição do amado, pela falta de carinho, por uma mágoa qualquer. Também pode estar atrelada a algum problema familiar, com os filhos, marido, por questões financeiras e, naturalmente, às questões hormonais, ginecológicas etc.

A perda do desejo torna a mulher amarga, crítica de si mesma e de outras mulheres, tudo se torna problema, se acha menor que as outras e não consegue se achar bonita. E, mesmo que sua postura não revele nada disso, dentro, em seu peito, todas essas características estarão corroendo seu emocional de modo que a cada dia sua relação com os homens será de afastamento.

Sua negação ao sexo é tão forte que ao perceber um homem se aproximando, rejeita-o como a um bicho, pois não se conforma que possa ser objeto do desejo de alguém, uma vez que não se enxerga assim.

Sua ojeriza não é pelo homem, mas pelo que ela supõe representar a ele (imagem projetada). Ela rejeita a si mesma e transfere isso para o outro através do afastamento e da solidão sexual.

É fundamental para o ator compreender que com a frigidez na ativa a mulher automaticamente perde uma série de nuances de delicadeza, de sensualidade.

Sua relação com o mundo parece ser mais bruta, mais pesada. Seu andar é mais objetivo. Ela não consegue sentir-se amada nem por ela mesma, por isso supõe que ninguém a amará mais. Mesmo linda acha-se feia. Um caminho interessante a ser seguido é uma pesquisa sobre a melancolia e a própria auto-estima.


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Cleptomaníaco - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

A construção do cleptomaníaco para a ficção deve se dar através de pesquisas sobre as vias do desejo. É um desejo enorme movido por um impulso que é maior do que a razão.

O cleptomaníaco não é um ladrão comum. Não é também alguém que furta algo impunemente. Traz em si a culpa. Sabe que o seu ato está fora dos padrões comuns, sabe se tratar de roubo, furto.

O que o move realmente é o impulso e o desejo. Impulso do que sente; da vontade de obter aquele algo o mais rápido possível.

Naturalmente, há também o prazer no ato da ação. O cleptomaníaco liberta-se de suas amarras ao colocar algo em seu bolso, o cleptomaníaco completa-se de uma maneira subjetiva. Completa-se uma vez que o próprio objeto desejado passa a ser parte dele, parte descolada. É como se aquele objeto, seja lá qual for, passasse a ser a falta.

Também, há a vergonha, a preocupação. O cleptomaníaco envergonha-se de si mesmo passado o êxtase da ação. Preocupa-se em não ser descoberto, e sabe que tal impulso é escravizador. Pode-se pensar, inclusive, num impulso compulsivo inexplicável.

Para o ator, o fundamental é entrar em contato com tal impulso, desejo e culpa. Se quiser, pode passear pelas questões da inveja. Mas muito rapidamente, pois não se trata nem um pouco da inveja. O cleptomaníaco não inveja nada, apenas quer o que crê ser ou ter de ser seu.

É interessante também que o ator busque informações sobre a própria doença. Que busque informações clínicas de especialistas da área. Ao se tratar ficcionalmente um personagem como esse, em momento algum, deve ser posto em jogo traços que o afastem de seu público.

E se o ator estiver realmente interessado num mergulho mais profundo, que adentre nas questões da culpa e procure a melancolia, e que vá às questões do prazer e entenda mais o desejo.


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Cego - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

A questão do cego na ficção, seja no teatro ou no cinema/TV, é muito rica. A construção basicamente é interna. O olhar do homem cego se dá através das percepções, de seus instintos e de sua aguçada sensibilidade em relação a tudo a sua volta.

Ao ator um exercício interessante é a meditação diária, o mergulho interno, o silêncio do diálogo interior. É um exercício que apresenta resultados surpreendentes. Um outro ponto a ser observado são os sentidos.

A realidade é que ao compor um personagem cego, o ator ganha a possibilidade de se conhecer de uma maneira mais atenta, isso, naturalmente, se a composição for bem feita.

É comum que atores partam para a questão da visão, para a questão daquilo que teoricamente falta ao cego, que é o olhar com os olhos. No entanto, a grande maioria esquece que os olhos do cego, que o olhar que o dirige, são suas mãos, seu paladar, seu olfato, sua audição, sua consciência motora de um modo pleno.

O fato de não olhar com os olhos possibilita sua maior intimidade com o todo do universo. O cego é capaz de contemplar com muito mais qualidade algo que um homem que enxerga com os olhos não consegue sequer supor poder.

Outra vala comum na concepção de um personagem cego é a questão do colocá-lo numa posição de vítima, de coitado. E não é. Se pararmos para refletir de uma maneira mais profunda e sincera, nós chegaremos à conclusão que o fato de não enxergar isso que a maioria de nós esclarecidos enxerga faz do cego um privilegiado. De certa maneira, com todo o devido respeito, o olhar do cego é intimamente ligado à poesia, à metáfora.


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Assassino - Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.

Para a construção de um assassino é importante que o ator saiba o que levou esse homem (ou mulher) ao assassinato. Há o assassino frio, que é aquele que mata friamente. Esse é manipulador, o homem calculista que mata por matar. Esse assassino frio carrega dentro de si um ódio desenfreado capaz de ser despejado em qualquer pessoa a qualquer momento. Provavelmente esse homem tenha um histórico nada familiar em sua vida.

É interessante que o ator pesquise sobre as repressões e sobre as frustrações. Muitos assassinos possuem ambas numa dose excessiva. Esses homens estão se vingando da vida por algum motivo. Algo não deu certo.

A morte, matar alguém, para o assassino frio, é como voltar à vida. É a morte como a representação da vida. O assassino frio não possui a culpa.

Na realidade, a culpa existe, mas num grau minúsculo. É confundida com uma série de outros sentimentos que não permitem ao assassino entrar em contato com nada além do ódio. É como se a culpa de sentir culpa metamorfoseasse a culpa num ódio por sentir culpa - que por sua vez transforma-se em ódio pelo outro, que acaba em morte.

Com a morte do outro, o assassino mata o seu ódio e volta a viver. No entanto, é um ciclo vicioso, pois logo tudo se repete.

Há o assassino passional, que é o homem que mata por impulso. Esse não deixa de ser assassino, no entanto, o que o levou ao ato foi alguma situação extrema.

Do ponto de vista da lei naturalmente tal homem não deixa de ser assassino, porém, não pode ser comparado ao outro. Sua ferramenta é a vingança pessoal, enquanto a do homem frio é também vingança, mas da vida.

O passional tem o alvo certo, enquanto o homem frio atira em qualquer um. Um assassino passional não dirá as mesmas coisas que o homem frio. O que o move é um outro tipo de sentimento, sentimento esse que o homem frio não possui uma vez que está preso àquilo que acabamos de citar acima.

O importante da construção de um assassino é saber de que tipo de assassino se trata, para conduzir a construção da melhor maneira possível. E isso se dá em todos os sentidos. A postura de um é oposta a do outro. A maneira de olhar, de andar, de falar. Tudo se modifica de acordo com o tipo de assassino que estiver sendo construído.


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Anoréxica - Perfis de personagens

 Perfis de personagens por Alex Giostri.

Uma personagem com anorexia geralmente é dada a um ator magro uma vez que a anorexia é a imagem distorcida de uma pessoa magra sobre si mesma.

A anorexia está ligada à imagem de uma pessoa magra que acredita estar acima do peso. Seu comportamento geralmente não se difere de nenhuma outra pessoa, porém seu discurso revela sua insatisfação com o próprio peso. Na hora de se alimentar come muito pouco, vive de dieta.

Há casos de pessoas com anorexia que comem compulsivamente até não agüentarem mais. Nestes casos, a bulimia entra no circuito uma vez que todo o alimento ingerido é posto para fora induzidamente ou não. Nos casos de pessoas que se alimentam compulsivamente para depois vomitar já se soube até de rompimento de estômago.

Ainda das pessoas que se habituaram ao vômito há um prazer ao pôr o alimento para fora. A vontade de comer é infinita, mas a culpa do alimento ingerido é maior. Com o vômito a pessoa livra-se de todos os sentimentos e também do alimento. Pessoas assim costumam se alimentar novamente logo após o vômito. É um ciclo vicioso.

Pessoas que sofrem de anorexia não falam sobre o assunto, não aceitam ir ao médico e depois de curadas não compreendem o porquê passaram pelo processo da distorção da própria imagem. Geralmente são meninas e sempre jovens. Dificilmente a anorexia é diagnosticada numa mulher de mais de 40 anos.

Observação: A Bulimia é uma doença e a anorexia é outra.


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Alcoólatra - Perfis de personagens

 Perfis de personagens por Alex Giostri.

Personagem muito comum no universo da ficção, o bêbado geralmente é construído de uma maneira não tão fiel a um bêbado no mundo real. O bêbado na ficção costuma ser apresentado como aquele que tropeça e quase cai.

O ator, ao buscar as informações, opta por um excessivo trabalho de desequilíbrio físico quando, na realidade, um bêbado no mundo real não quer demonstrar que está embriagado. Ao contrário, sua busca, a do bêbado, é exatamente a oposta. Quer porque quer estar em pleno vigor; o bêbado não quer tropeçar nem quase cair. Quer o equilíbrio perdido. E essa relação altera totalmente a concepção.

Há uma diferença entre o homem que bebe casualmente e fica bêbado e o alcoólatra. Nem todo bêbado é alcoólatra. O alcoólatra não pode beber. Perde o domínio de sua vida, não produz socialmente, e a bebida só o faz afundar. É escravo do álcool e o que busca é a embriagues, uma possível fuga.

Para o alcoólatra qualquer acontecimento é motivo de uma dose, um gole. Sua dependência pode o deixar violento, agressivo, omisso, tímido, desbocado, enfim, não há uma só característica para pontuarmos; do alcoólatra tudo se espera. E é assim que deve ser pensado.

Um olhar interessante para a concepção é que o ator pense a trajetória de seu personagem até o momento da ação. Que pense o porquê tudo está como está e o porquê o personagem chegou nesse limite.



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Adúltera - Perfis de personagens

 Perfis de personagens por Alex Giostri.

A personagem adúltera é um tipo muito interessante de pensarmos. Ora, a mulher que trai pode ter inúmeros motivos internos para ir além, pular a cerca, quebrar o juramento da fidelidade em vida, enganar o namorado. A questão primordial de ser refletida no primeiro momento em que se quer pensar tal personagem é que não se pode - nem poderá - estabelecer uma linha de reflexão carregada de carga moral.

Isso naturalmente não significa que o pesquisador tenha que se identificar ou mesmo aceitar tais atitudes na vida real. No campo da ficção é fundamental que se tenha um olhar neutro sobre qualquer personagem. E a adúltera é uma dessas.

Ora, o que significa a traição para essa nova pessoa que se está pensando ficcionalmente? Será um gosto natural pelo proibido? Será uma insatisfação sexual? Uma insatisfação na relação de um modo amplo? Se sim, qual então? Será essa nova mulher, mal amada, desprezada, mal tratada?

É interessante que o pesquisador tenha a construção da significação do homem traído para a mulher traidora. O que esse homem traído representa para tal adúltera? O que um dia representou? O que mudou entre a atração e o primeiro encantamento e o adultério?

É importante que se pesquise o objeto de desejo da adúltera, o amante. Qual sua representação na cabeça da adúltera? Estará o amante tampando algo? Que algo? Qual o sentimento da adúltera?

Neste sentido de sentimento, é muito interessante de se pensar na questão da culpa, da melancolia, do ódio, da vingança e da transgressão como alimento para a relação tida “fracassada”, ou “incompleta”.

A culpa, ou sua falta, é interessantíssima de se pensar; a culpa, ou mesmo sua falta, são condutores altamente capazes de levar o indivíduo aos lugares mais sombrios no que diz respeito às sensações secretas de cada um. Dela, ou de sua falta, é possível desenhar subjetivamente a expectativa construída por parte da adúltera. Uma aventura? Uma possível nova relação? Uma substituição?

Cada um de nós tem características singulares; as adúlteras também. Essa singularidade é que vai ditar a qualidade da construção, e o resultado obtido na concepção.


Uma dica: leia “Madame Bovary”, romance de Gustave Flaubert, clássico da literatura francesa.



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Perfis de personagens

Perfis de personagens por Alex Giostri.



Adúltera  
A personagem adúltera é um tipo muito interessante de pensarmos. Ora, a mulher que trai pode ter (...)  Leia mais

Alcoólatra 
Personagem muito comum no universo da ficção, o bêbado geralmente é construído de uma (...) Leia mais

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Cego 
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Cleptomaníaco
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Frígida
A frigidez é a ausência da libido. Uma mulher frígida provavelmente possui a auto-estima baixa. (...) Leia mais

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O jogador em questão é o jogador compulsivo. Aquele que joga até o que não tem. O que põe(...) Leia mais

Neurótico 
O neurótico que conhecemos é aquele homem com os nervos à flor da pele. No termo psicanalítico a (...) Leia mais

Ninfomaníaca
Uma personagem ninfomaníaca é muito interessante de se conceber. Geralmente personagens (...) Leia mais

Mendigo
A representação de um mendigo à sociedade é ambígua. Aparentemente um ser desprezível (...) Leia mais

Romântico
Pensar uma personagem romântica não é nada complicado. O romântico é aquele ser que acredita nos seus (...) Leia mais

Suicida 
A primeira observação é a de que uma pessoa suicida sente-se só, independente de onde (...) Leia mais

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O tarado sexual, o maníaco (que é o caso aqui) é também o compulsivo por sexo. Na maioria dos (...) Leia mais

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A figura do travesti por si só já é uma causadora de polêmica. É, na mesma medida, adorada e (...) Leia mais

O ATOR E O ATO DE ATUAR

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

A questão do atuar muitas vezes fica confusa, mal resolvida na vida do ator. O atuar está diretamente ligado à interpretação, à interpretação de algo ou alguma coisa. No entanto, essa relação vai além. Além uma vez que o atuar é aquilo que se apresenta a alguém, aos espectadores. E o que se apresenta aos espectadores é algo já elaborado.
O que deve estar em primeiro plano para o ator é o processo, a elaboração. Não há uma interpretação, ou vivência - seja lá como se chamará aquilo que se apresenta - se não houver uma boa elaboração, um processo eficaz onde todas as informações necessárias para a construção do que se está construindo forem bem refletidas e aproveitadas.

Levando em consideração a famosa frase que diz: “nada se cria, tudo se copia”, o ator deve “copiar” o que os mais experientes oferecem. Copiar no sentido de compreender de onde os mais experientes, os atores que estão há mais tempo na ribalta, beberam suas informações. Isso significa que a base de qualquer elaboração, de qualquer processo é o conhecimento. Conhecimento técnico, teórico; conhecimento de vida.

Do conhecimento técnico o que o ator deve tentar compreender é que há e houve muitos pensadores a respeito do assunto interpretação. E que cada um desses pensadores, teóricos, encenadores, dramaturgos, encontrou a melhor maneira de desenvolver o seu ofício, o seu pensamento, a sua reflexão, dentro daquilo a que se propôs.

Ao ator resta a leitura e a compreensão do maior número de autores possíveis dentro de sua área no que diz respeito às técnicas. Não há porque citar nomes, uma vez que ao ator é fundamental a curiosidade, a vontade do saber mais. Portanto, a idéia é que cada ator leitor busque esses tantos nomes que integram uma listagem fundamental ao conhecimento técnico-artístico de seu ofício.
Um outro ponto fundamental para o desenvolvimento da arte de atuar do ator é que ele primeiramente se atenha à interpretação do palco para dentro, do estúdio para dentro, da locação para dentro. Nunca ao contrário. A vida deve ser vivida. E ao deixar-se viver, o ator deve preocupar-se com a sua boa relação com a natureza, com o caos, com as pessoas, com a falta de pessoas, com as dificuldades, com seus ganhos, suas perdas, suas alegrias, tristezas, amores, falta de amores, enfim, é essencial que o ator integre-se à vida de modo genuíno e dela se utilize para conhecer-se e conhecer o outro.
É uma estratégia importantíssima uma vez que quando se fala de interpretação se fala de interpretação de alguém ficcional com vida. E quando se trata de vida, da vida de uma outra pessoa que não existe, mas que passa a existir a partir do momento em que foi elaborada e apresentada ao público pelo ator, é praticamente impossível que se alcance uma verdade se não houver essa relação primária entre o homem e a vida.

A elaboração nada mais é do que a busca pelo conhecimento da natureza humana, pelas questões do mundo, do universo em que se vive e até a do universo desconhecido. No momento em que o ator percebe que a arte de atuar é o resultado dessa busca, todo o movimento passa a ser mais completo; fica fortalecido o bastante para que possa haver então a busca pelo conhecimento teórico não técnico.

O conhecimento teórico não técnico é aquele dos livros, dos romances, dos clássicos da literatura, da poesia, dos livros bons e ruins. Nunca se viu na história um bom ator que não tivesse um mínimo de conhecimento teórico não técnico ou então um profundo conhecimento pelas questões da vida, do ser humano. E o caminho para esse conhecimento é a leitura, a busca pelo saber. E isso implica em tempo, ter tempo e disposição. E tempo e disposição são indispensáveis ao ator.

A bem da verdade é que a arte de atuar é algo que o indivíduo já possui dentro de si, mas é o ator com sua busca desmedida pelo conhecimento técnico, teórico e da vida que aprimora e a apresenta profissionalmente.

Agora, é importante que se saiba que não é todo indivíduo que tem essa predisposição à interpretação, à arte de atuar. Essa é uma questão de aptidão. E alguns dos indivíduos não possuem e nunca possuirão.

Muitos jovens buscam inúmeros cursos profissionalizantes e esquecem que ao chegar a esses cursos devem ter uma mínima base, uma pitada da tal aptidão. Caso contrário, nada acontecerá. O que um curso oferece em geral são técnicas, experiências de pessoas mais experientes e métodos. Nenhum dos cursos oferece talento, competência, perseverança, dedicação. Isso é responsabilidade de cada um dos participantes.

Ainda sobre a frase dita acima “nada se cria, tudo se copia”, o ator deve perceber que esse copiar não é tornar-se igual a um outro ator que deu certo; sim compreender a trilha percorrida do início ao fim. Não há o porquê queimar etapas. E o fato de um jovem ator seguir a trilha percorrida por um ator experiente que deu certo não é garantia de sucesso nem de reconhecimento.

O importante neste raciocínio e nessa busca é, de fato, a sensibilidade e a capacidade de percepção. Um ator predisposto à arte compreenderá exatamente o significado dessas palavras e seguirá o seu próprio caminho após observar o caminho dos outros. Esse ator deve ter em sua bagagem todos os conhecimentos citados acima e uma vontade enorme de fazer bem ao outro.

9 de setembro de 2011

SOBRE AS CONSTRUÇÕES PESSOAIS

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

É inevitável que o ator não leve para sua arte características de seu caráter ou traços de sua personalidade. Isso não significa que a personagem seja o ator. Significa que cada indivíduo traz, em sua caixinha particular, as próprias características e emoções que foram sendo constituídas, lentamente, ao longo de sua vida.

A realidade é que muitos jovens possuem o desejo de serem atores. Sonham com seus rostos nas novelas, nos palcos lotados e nos cinemas. Para realizarem tal desejo, muitos saem de suas cidades, que geralmente são pequenos municípios afastados dos grandes centros nacionais RJ/SP e enfrentam uma maratona de cursos, palestras, workshops. Alguns caem nas mãos de cursos bons, com conteúdo fundamental à formação do ator. Outros caem nas garras dos famosos conhecidos caça-níqueis, que se aproveitam dos sonhos alheios para ganharem um dinheirinho.

Porém, a questão a ser discutida não são os cursos. Não estamos aqui para isso. O que nos importa são as construções pessoais.

Neste sentido, o que é válido saber é que não será um curso que tornará alguém um ator. Naturalmente um bom curso oferece um conhecimento teórico, prático, oferece a possibilidade de conhecer mais do próprio ofício, mas nenhum curso, nem o bom nem o ruim, oferece ao aluno uma maneira mais profunda de olhar para si mesmo, que é o que é, de fato, o mais importante.

Essa maneira profunda de se olhar é para que o ator tenha mais intimidade, ou uma relação mais ampla, com o seu próprio eu, com a sua própria edificação emocional, psíquica, com as suas limitações, com os seus desejos. É fundamental que o ator tenha essa ciência de si mesmo.
Essa ciência será somada ao conhecimento técnico dos cursos que aí sim será utilizada com grande eficiência.

Num raciocínio básico é fácil compreender que uma pessoa não pode conceber ficcionalmente uma outra se não se conhecer num plano mais profundo, se não tiver uma relação clara consigo mesmo, se não tiver munido de uma sensibilidade aguçada sobre as suas emoções e os seus sentimentos.

Para isso, é importante que o ator faça uma viagem ao seu passado, à sua infância, que busque suas primeiras referências, que passeie pela sua adolescência, que traga à mesa alguns de seus conflitos passados, una-os aos conflitos presentes e os resolva, ou pelo menos os compreenda.

Não há como se tornar um bom ator se o sujeito não for uma boa pessoa e não tiver munido de conhecimento teórico, cultural e emocional suficiente para suportar a estrutura emocional do estar em cena fazendo a diferença. O estar em cena num plano médio é simples, para muitos, não enche os olhos de ninguém. No entanto, o estar em cena fazendo a diferença é o que há de mais gratificante ao ator. E para isso é que o conhecimento sobre a sua construção pessoal até então, e de como está construindo a partir de agora se faz imprescindível.

Esse trabalho além de voluntário e opcional é totalmente solitário, assim como construir uma nova personagem. É ideal que o ator entre em si e vasculhe cada cantinho de sua vida, de sua memória. É ideal que o ator entre em contato com cada dor vivida, com cada vitória, com cada perda. É praticamente vital ao ator essa experiência. É como se livrar das amarras. É como se o ator tivesse que navegar em busca das pequenas e grandes repressões que ficaram para trás e que nem se lembra mais.

Não é um trabalho fácil, pois é um trabalho de autoconhecimento e crescimento. E crescer dói. E a busca pelo autoconhecimento é sempre minada pelo terreno da negação e da mão na cabeça.
Uma coisa é certa. Sempre se descobre que não é tão ruim como se pensava e também não tão bom como sempre pareceu ser. É como desatolar. Pôr-se em movimento. Ação.
Um ator que tem noção dessa vital relação entre o seu ofício e o seu eu certamente terá um espaço interno infinitamente maior daquele que apenas conformou-se m fazer os pequenos e grandes cursos país afora. Não há como apropriar-se de nada em lugar algum sem antes se apropriar de si próprio e de suas emoções, ações e reações em relação à vida.

Num processo de clínica psicanalítica o caminho traçado seria o da desconstrução do eu para uma reconstrução do novo eu. Pois não há como um edifício tornar-se belo se não houver um projeto inicial apresentando todas as etapas: início meio e fim. Ou seja: o ponto de partida e o ponto de chegada.

8 de setembro de 2011

O ATOR E A POESIA

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

“O verdadeiro aplauso que deves procurar não são as palmas subitamente ouvidas após um verso deslumbrante, mas o profundo suspiro que escapa da alma e a alivia, após a opressão de um longo silêncio.”
DIDEROT, Denis

A relação do ator com a poesia deve ser íntima. Um ator que tenha um conhecimento médio no universo poético terá naturalmente uma maior desenvoltura em seu ofício. E a poesia não são apenas os versos que se lê em livros, mas também as letras musicais, as frases bem ditas, a maneira que se experimenta a vida.

Da poesia, da obra poética, é fundamental que o ator leia tudo o que puder. Quanto maior for o seu conhecimento maior será o seu espaço emocional e intelectual. O objetivo maior dessa aproximação entre o ator e a poesia é a questão lírica que a poesia contém em sua estrutura. O eu lírico do poeta é também o eu lírico do ator, que na verdade está levando á cena o eu lírico de uma personagem, que é fruto de um eu lírico do autor.

O poeta ao escrever seus versos expressa suas sentimentalidades nos versos. O ator, ao compor sua personagem, exala através de sua fala as palavras que o autor, que também já foi chamado de poeta dramático, escreveu. Ambos falam de seu eu. Um revela a própria verdade, o outro revela a verdade daquela pessoa que não é ele próprio, mas que também é naquele momento. Neste sentido, pode-se pensar que as impressões do ator emolduram as impressões da personagem, que revela ao público não apenas a sua impressão, mas também a impressão do ator e de sua vivência emocional pessoal. Todos falam ou tratam de si subjetivamente.

O fazer poesia para o ator é quando é capaz de ocultar-se e à palavra que diz, transformando-a apenas em impressões para os espectadores. A fala do ator é também poesia. Toda fala é também canção, assim como a canção vem da fala. Então, na medida em que o ator é sensível à poesia também é sensível à palavra, consequentemente à maneira de falá-la, declamá-la ao seu público.

E ao transformar a sua fala em poesia em cena, o ator se mune da boa respiração, das pausas, das inflexões, do conhecimento da língua, da pontuação e do sentido de tudo que está dizendo e fazendo. O ator completo é poesia.

E essa é a questão:

O que diferencia o poeta do ator é que o poeta é poeta de sua obra e o ator é poeta do mundo e do próprio poeta. É o ator que declama o que o poeta, que é também o dramaturgo, escreve em seus papéis.

7 de setembro de 2011

MINHA HISTÓRIA DE VIDA E MEUS OBJETOS PESSOAIS

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

A história de vida de cada um é muito importante e deve ser posta como primeiro plano na hora de pesquisar um pouco mais sobre a natureza humana. Há uma tendência natural em recorrer aos manuais, às aulas, às palestras, aos dicionários, no entanto, há pouquíssima procura pela pesquisa pessoal. O ator é uma ferramenta, seu corpo é o agente, sua voz a fala, suas emoções transferem-se aos seus espectadores. Todo o resultado artístico do ator é advindo de tudo que estudou e, sobretudo, de toda a sua vivência no mundo. E tais vivências são partes, senão a parte toda, de sua história de vida.

“Como alguém se torna o que é?”, Nietzsche.

Neste sentido, é interessante que o ator procure a criança dentro de si. A criança é a responsável pela perseverança do sonho, pela luz no fim do túnel, pela crença de que tudo vai dar certo. Ela traz o que um dia já foi o presente. A criança tem dentro de si as primeiras observações feitas sobre o mundo, as primeiras impressões, os medos mais freqüentes, as atitudes que ela mais gostava; a criança possui o frescor da experiência das primeiras coisas, um frescor que no homem adulto já não existe mais. A criança tem o sonho e o lúdico dentro de si firmemente alicerçados. E onde há sonho há a esperança.

Partindo do início, que é a infância, o ator vai redesenhando a sua trajetória de modo que seu pensamento se volta ao que um dia já foi. E essa volta, esse novo olhar sobre aquilo que foi vivido pela criança, tem um peso indizível no processo de criação. É como se o ator voltasse a uma determinada situação infantil e a experimentasse novamente, só que agora com os olhos de um adulto. É delicado, pois mesmo adulto, o que o ator deve procurar é a sensação, a maneira que lidou com tal situação na sua infância. Isto é: como sentiu essa criança dentro de mim? Essa é a busca. E isso é parte da sua história de vida.

Um outro ponto chave para o amadurecimento do ator é a busca pelas repressões pessoais. É fundamental que o ator mantenha um diálogo honesto consigo mesmo para não se atrapalhar na sua vida profissional. O mais agravante quando isso não acontece é que inevitavelmente o que não está resolvido internamente se externará a qualquer momento, e pode ser numa cena, numa personagem, com um colega.
A grande maravilha de ser ator é justamente poder lidar com os próprios demônios e colocá-los para fora, destruí-los, resolvê-los. Não no amigo de cena, nem na personagem, mas consigo mesmo. Não há ofício mais propício ao amadurecimento pessoal do que o do ator.

Se tratando de história de vida, pode-se arriscar dizer que cada um de nós passaria a vida toda pensando na sua própria e não chegaria a um fim objetivo. São muitas as lembranças, muitas as sensações, muitos os traumas. E isso que é o belo de se estar na vida, de poder aproximar-se de um outro semelhante e beber de toda a sua história.

Além da própria história, uma outra ferramenta boa para o ator buscar são os seus objetos pessoais e seus significados simbólicos. Cada objeto possui uma energia em torno de si. Energia essa produzida pela relação que cada um de nós estabeleceu. Esses objetos devem ser compreendidos pelo ator adulto e deles serem retirados o que ficou esquecido. Para as atrizes, por exemplo, veja que interessante, antigamente a filha era a boneca. Davam-lhe banho, punham nome, choravam pela boneca, diziam que jamais a abandonariam. Os anos passaram e a boneca empoeirou-se num quarto no fundo da casa. O que ficou esquecido? Só saberá quando for à boneca empoeirada, limpá-la e buscar o que ficou lá. Isso mesmo se a mãe da boneca tenha se tornado mãe de uma menina real. O sentimento é outro. Basta entrar em contato. São pequenos detalhes que fazem toda a diferença.
Para os meninos, as atores, os carrinhos, as bolas... E mesmo adultos, atualmente, cada um de nós possui um objeto preferido em casa. Por que será? É hora de voltar lá e tentar saber mais. Isso é muito mais importante para a construção do ator do que uma apostila.

SOBRE O ESTÍMULO E SOBRE AS EMOÇÕES

 Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

É importante que o ator tenha a compreensão que as emoções são fundamentais para a sua criação. E mais ainda, que a maneira que identifica e lida com elas podem auxiliá-lo no todo de seu trabalho. Essa maneira está muito atrelada à forma que cada um constrói o próprio universo; ao modo que cada um age e reage na vida. E tanto a ação quanto reação, as duas, são as respostas das percepções guardadas em caixinhas particulares, que o indivíduo possui dentro de si.

Ora, das emoções o que o ator deve ater-se profundamente são as suas causas e as origens. Como, por exemplo, um ator pode identificar dentro de si uma determinada emoção distante de seu universo particular?
Naturalmente, se tratando de emoções para construção de personagens, o ator trabalhará com o que aqui pode ser chamado de emoção subjetiva, que é uma emoção produzida pelo próprio eu do ator, através de sua vivência e memória emocional, da maneira que experimenta a vida.

Esse experimentar a vida é fundamental para que o ator compreenda que tudo ao seu redor está ligado às sensações e que em tudo que sente a sua função é destrinchar aquilo que acabamos de pensar como causa e origem. Isto significa que tais sensações, que estão conectadas às emoções, são reações (estímulos) de alguma ação externa ou interna. Essa compreensão, esse entendimento, facilita a vida do ator na hora da lapidação da personagem. E nos casos das emoções distantes da realidade do ator, o caminho mais seguro é a pesquisa de campo.

Ainda no que diz respeito às emoções, a prioridade ao ator é que faça o mergulho interno e a reflexão sobre todas as descobertas pessoais. É uma volta a si onde o que justifica tal atitude é a busca sobre as origens de tudo o que se sente. Isso é subjetivo e abstrato demais, no entanto, para facilitar o entendimento basta que se reflita sobre uma determinada reação emocional.
O ódio, por exemplo: um homem tem ódio de alguém num repente, tem ódio porque alguém fez alguma coisa que não lhe agradou. Geralmente o que desencadeia o ódio não é coisa em si, mas o que esse homem já tinha guardado dentro de sua caixinha. O ato do outro apenas abriu tal caixinha e colocou o sentimento para fora. O que interessa ao ator não é o ato em si, mas o que o ato provocou no outro. Mas não só isso também. O que interessa mesmo é compreender o porquê aquele ato provocou tal reação no homem. Indo por esse atalho, que é um pouco mais complicado, o ator terá muito mais ferramentas para se defender na hora da criação. O que antes era chamado interpretação passará a se chamar vivência emocional profunda.

É no decurso dessa vivência emocional profunda que o ator atingirá o cerne da personagem que está levantando e das pessoas que estão o assistindo. A emoção sentida pelo ator passa a ser a emoção transmitida e absorvida pelas pessoas. O ator exalará em seus poros aquilo que sente apenas se o que está sentindo tenha sentido para si e para seu público.

Neste sentido, pode-se pensar em estímulo. O ator provoca, através de suas ações, o estímulo de quem o vê. Faz com que todas as pessoas reajam de acordo com as suas experiências na vida, através de suas caixinhas particularidades. Ao exaltar o amor, o ator provoca a exaltação do amor em cada uma das pessoas. E, cada uma delas, terá a sua maneira pessoal de compreender o amor, mesmo o amor sendo um sentimento dito universal. É como se o ator propagasse uma emoção generalizada para que as pessoas sentissem coletivamente o que foi apresentado, no entanto, em cada uma delas a reação interna será singular.

Para a construção de uma personagem, o ator deve entrar pelo caminho de quem age passivamente diante de tal emoção; já para a apresentação da mesma personagem, a via é ação ativa, onde o ator distribui o que tem a oferecer e estimula quem estiver disposto a entrar no jogo.

Um ator preparado a entrar em contato com suas emoções e com as emoções do mundo, naturalmente está mais apto a desenvolver o seu ofício daquele que acredita que ao ator cabe apenas a interpretação de um papel e nada além. O espaço interno do ator apto a encarar as emoções é infinitamente maior. É esse espaço que proporcionará ao indivíduo a qualidade de seu trabalho, pois o que está na mesa trata-se do que há de mais sombrio e de mais transparente na natureza humana, suas emoções e as maneiras de lidar com elas.

Um ator apto ao desenvolvimento de sua função é um homem capaz de sentir profundamente na pele todas as dores e todas as glórias. É um homem capaz de captar o som da folha seca que cai da árvore. É aquela pessoa que sofre terrivelmente com a perda de alguma pessoa que nunca viu. É aquele ser que compreende o peso da palavra amor.
Um ator mergulhado nas suas emoções sorri para alguém desconhecido, é capaz e amar e odiar em frações de segundos. É do ator que se espera ouvir e ver as coisas mais belas e mais profanas do mundo, dele e de suas emoções.

6 de setembro de 2011

SOBRE AS PALAVRAS E SUAS INFLEXÕES

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

Um carro possui um motor. O motor é movido a combustível. Sem o combustível, o carro não anda. Ao ator é interessante pensar que o seu corpo físico é o motor e que a palavra é o alimento de seu corpo, isto é, o combustível. O indivíduo traz consigo sua identidade emocional e suas características psíquicas que o definem como um ser singular. Para que possa comunicar-se com alguém demonstrando parte do que é como pessoa, esse indivíduo utiliza-se das palavras, que são o seu combustível, que, por sua vez, é o que transforma as suas sensações abstratas em linguagem.

Pensando assim, ao ator não basta apenas utiliza-se dessa linguagem, das palavras, se não souber manejá-las, compreendê-las. Essa compreensão, esse manejo, é, ao ator, o que se classifica como inflexão. Como a boa maneira de expor a palavra ao seu espectador. É quando o ator, além de trabalhar a respiração no momento exato, dando as pausas necessárias na hora exata, dá à palavra, às letras, às sílabas, todo um tratamento minucioso no ato da fala, possibilitando assim que quem o assiste sinta-se impressionado com o que ouve. Impressionado no sentido de impressão.

A inflexão é a impostação da voz, é o conhecimento das palavras e de seu poder de alcance, é da relação íntima que o ator tem com o seu combustível. E essa relação entre o ator e a palavra se faz através da leitura, do entendimento das palavras (de seus significados) e dos exercícios que faz dia-a-dia. Há muitas maneiras de dizer a mesma palavra. E aí entra a respiração, o olhar, o tom da voz, a agilidade da fala, o trabalho corporal. É apenas mais um dos ingredientes para a construção do ator, mas é um dos fundamentais, pois é, a palavra, a via de acesso mais direta e rápida na maioria das vezes.

A falta de boa inflexão e, automaticamente, da boa fala, está ligada à falta de leitura e de intimidade com as palavras, mas também está ligada à ansiedade, que é capaz, se não for bem resolvida, de complicar a vida do ator. É na ansiedade que os batimentos cardíacos se desestabilizam (para mais ou para menos); é a ansiedade que aumenta a insegurança do ator, seja ela o tipo que for (tipo de insegurança – causa).

É válido lembrar que o espectador está na platéia para assistir ao que se oferece. Isso significa que o espectador está disposto a ouvir o que os atores têm a dizer. E sendo essa uma afirmação óbvia, ao ator cabe a compreensão de que a sua única obrigação é a de transmitir a mensagem daquilo que está em jogo na cena. E tal mensagem só chega ao entendimento do outro, que é o espectador, se for bem transmitido, de maneira delicada (mesmo que intensa). Um ótimo exercício é sempre o ator colocar-se na posição de quem ouve. É o trabalho do distanciamento.

A inflexão está ligada à técnica. Mesmo o ator visceral, aquele que age com o impulso, com a emoção à flor da pele, mesmo esse ator deve ter dentro de si um espaço racional para controlar o que sai de sua boca. E esse espaço se dá naturalmente. Não há técnica para alcançá-lo. O que o ator pode fazer é mergulhar dentro de si e aguardar que algo toque o coração. É ouvir as suas limitações e jogar com elas em prol de seu trabalho e de sua platéia.

O bom resultado é conseguido também através da leitura incansável do mesmo texto e do entendimento de cada pontuação do autor, de cada palavra posta no texto. O ator deve compreender que tudo que há no texto foi posto por alguém que pensou muito sobre aquele universo. E que cada palavra, ou falta de palavra, que cada pontuação, ou falta de pontuação, que cada concordância verbal, ou falta de concordância verbal, que todas elas foram postas propositalmente pelo autor (na maioria dos casos, mas pode haver um erro ortográfico) e que tudo isso passa a ser o seu guia de trabalho, o guia do ator.

Essa busca pela palavra, pelo aprimoramento técnico daquilo que sai da boca do ator, dessa busca pelo silêncio, pelo tom mais adequado, pelas pausas precisas, são e sempre serão a busca pela própria profissão, pela própria vida. O estar em cena sob os refletores, sob os aplausos, deve ser entendido como uma conseqüência e não como objetivo.

SOBRE A RESPIRAÇÃO - O SILÊNCIO E AS PAUSAS

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

A respiração é fundamental à vida. Ao ator é essencial a boa respiração na vida e na hora de construir suas personagens. A respiração está ligada à emoção de modo muito próximo, tão próximo que a cada mudança no padrão da respiração, a reação emocional é alterada de maneira visível.

O ator, ao construir uma personagem, deve se ater à sua respiração. Não a dele, mas à respiração da personagem. Isso implica entrar em contato com o mundo das percepções, da sensibilidade do ator sobre o seu objeto de pesquisa, a personagem.

O ritmo da fala pode ser vital ou destruidor para determinadas personagens. Neste sentido, é interessante que o ator alguns dos exercícios de respiração e que também entre em contato consigo próprio conhecer melhor o ritmo de sua respiração. Há um ciclo natural da respiração e há um ciclo respiratório do dia-a-dia, que nem sempre é aquele que algum de nós gostaria de ter.

O objetivo do ator ao aprofundar-se nesta questão da respiração é ganhar espaço da fala, de reação e ação e, sobretudo, conhecer o seu potencial de fala e de reserva.

A natureza, o contato com os animais, com os bichos mais agitados, mais calmos, com as plantas, flores, com o mar, toda essa relação com as coisas do mundo, da vida, podem ser úteis ao ator. É das pequenas coisas mesmo que o ator poderá retirar o seu material de pesquisa. E se tratando de natureza humana, das relações com a vida, sabe-se que o ar, a respiração, é o alimento, o combustível de cada um de nós.

Quando o ator tiver essa compreensão sobre a respiração e de que o seu ar é o ar comunicador de sua vida em cena, as respostas naturalmente se oferecerão a ele.
A respiração, nesta reflexão, está ligada à fala. Portanto, ligada à fala do ator estão ligados o silêncio e a pausa.

O silêncio por si só é um agente comunicador muito mais eficiente do que a própria fala. Se o ator unir o silêncio e a pausa junto à respiração, à fala e às técnicas de interpretação, aí não há quem o segure de seu potencial dramático.

Para muitos, o silêncio é o vazio, o nada; o silêncio é muito relacionado à solidão. E a solidão é algo que muitas pessoas lutam a vida toda para não conhecerem. O silêncio relaciona-se com a ausência de algo, com ausência da palavra falada.

Ao contrário do que se possa imaginar, o silêncio é fundamental para o todo da criação dramática e também à vida. O silêncio como qualidade de vida pode ser uma alternativa para uma vida mais branda, mais serena e mais voltada para o autoconhecimento, que é o caso do ator, ou pelo menos deveria ser. Não o de estar sozinho, no silêncio, mas o de estar na busca do autoconhecimento dia após dia, minuto a minuto.

Esse autoconhecimento passa pela via do silêncio inevitavelmente, seja na hora de criar as personagens, seja sobre um palco ou de frente a uma câmera. É uma busca interessante essa do autoconhecimento, pois é necessário que o ator conheça-se plenamente para poder ceder o espaço de seu eu ao eu da personagem.

Portanto, o silêncio em cena é um elemento dramático fundamental e de uma funcionalidade espetacular. Um silêncio bem elaborado, no momento correto, dirá muita coisa, caso seja essa a intenção da cena e da personagem.

Paralelo a tudo isso, estão as pausas que também são silêncio, no entanto estão dispostas entre uma palavra e outra. É comum a todos nós uma ansiedade e até um pouco de insegurança que nos faz acelerar nossa respiração. Ao ator, tal ansiedade ou insegurança, ou ambas, pode levá-lo a comer letras ou a enrolar as sílabas, o que o deixará em maus lençóis publicamente, sobre um palco.

A construção da fala pode ser pensada, inclusive, através do silêncio e das pausas. Se o ator desenhar sua fala através dos pontos de virada e do silêncio o resultado pode ser surpreendente. O que é bom pensar é que a importância da fala e pausa é a mesma, assim como a importância do silêncio e do ator em cena.

Enfim, ao ator é fundamental o exercício com o silêncio, com a respiração e com as pausas. Primeiramente consigo próprio, depois com todas as personagens que criará.

5 de setembro de 2011

O ATOR E O AUTOR

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

Tudo se inicia no texto. Na realidade tudo se inicia no pensamento do autor. O autor tem uma idéia, pensa sobre essa idéia, formula questões, analisa possibilidades e constrói uma trama pensando na figura do ator. Sem um texto, o ator não pode criar nada, assim como sem o ator o autor não verá sua obra representada. Ambos são criadores. Um da sua própria obra e outro da visão, do entendimento da obra alheia.

É fundamental ao ator que tenha a consciência de que ao se utilizar das palavras do autor a sua função é transformá-las em impressões. Em impressões para os espectadores. Na mesma medida em que ao ator cabe a transformação das palavras do autor em impressões, cabe-lhe também ocultar o homem por trás de si apresentando apenas a personagem, sua ação e a fala.

A relação entre esses dois ofícios é muito próxima uma vez que ambos, autor e ator, iniciam seus trabalhos através de pesquisas e ambos doam seus espaços internos às figuras desconhecidas, irreais. O primeiro interlocutor do autor é o ator enquanto o do ator é o público. E mesmo sendo obra do autor a que está sendo apresentada pelo ator, passa a ser de sua autoria também a concepção, a leitura do que apresenta. É como se dentro do universo do autor o ator criasse a sua melhor maneira de dizer aquilo que se quis dizer.

Sendo também um criador, o ator fica muito mais completo uma vez que deixa de ser mera marionete para oferecer ao universo do autor seus pontos de vista e suas experiências de vida a respeito da personagem em questão. Há sempre o que aprender; o que observar de um outro ângulo. E por isso é fundamental que as duas pontas criadoras estejam sempre em sintonia e que ambas compreendam o que a outra quer falar.

Há uma corrente que diz que o autor é uma ferramenta social e que sua função é tornar a vida das pessoas menos dolorosa, é trazer um pouco de esperança para o mundo, é fazer com que os conflitos sejam expostos de modo não tão duro como a vida expõe. É uma corrente com razão. De fato essa é a função do autor. Há no ofício da escrita essa função social. E há também a mesma função no ofício do ator. E de uma maneira muito mais visível quando se trata de obra teatral, televisiva ou cinematográfica.

Por essa razão é mais que urgente que os atores jovens tenham a compreensão de que suas bases profissionais e emocionais sejam construídas sobre alicerces concretos para que possam levar seus discursos adiante de maneira digna. Essa consciência fará do ator um ator muito mais amplo, mas profundo e com mais responsabilidade em seu ofício.

4 de setembro de 2011

SOBRE A CRIAÇÃO DO DISCURSO

Alex Giostri, formado em cinema, ganhador de diversos prêmios e escritor de livros e peças teatrais.

“O teatro talvez seja uma das artes mais difíceis porque requer três conexões que devem coexistir em perfeita harmonia: os vínculos do ator com sua vida interior, com seus colegas e com o seu público.”
BROOK, Peter

O título pode levar o ator a pensar algo além do que se quer dizer aqui. Naturalmente há muito mais o que ser dito, no entanto, a criação se quer neste trabalho como maneira de discurso mesmo. O ato da criação do discurso aqui é a construção da fala, do que sai da boca do ator. E o que sai da boca do ator são palavras. Neste sentido, é fundamental que o ator tenha consciência de tudo o que diz para poder controlar a maneira que dirá.

O que é que move a ação de uma trama? Um conflito? Mais do que isso. É o verbo que move nossa vida e nossa língua. Ora, como alguém pode ir a algum lugar sem a utilização do verbo? Eu... Eu, o quê? Vou? Estou? Ela... Ela me... Traiu? Roubou? Amou?

É através do verbo, da palavra, do significado da palavra, que o ator pode se alicerçar em sua ação. Claro, num primeiro momento. Mas é o momento inicial e o mais importante, uma vez que sem o entendimento do que deve ser dito o ator não pode levantar personagem algum.

O interessante é pensar que através do conhecimento pleno da palavra e de seu peso, o ator avalia a essência da personagem a ser construída e insere o tom exato. O verbo de ação mesmo sendo o mesmo verbo terá, sempre, peso e medida distinta, isso conforme a atuação do ator e a personalidade da personagem. Essa liberdade e amplitude de criação só se dão se o ator tiver tal noção e aproximação às palavras.

A criação do discurso aqui se quer assim: o ator cria o seu discurso, que é a fala de sua personagem, através do conhecimento pleno das palavras a serem ditas por sua boca e por sua razão. Através de tal conhecimento, o ator insere a emoção e as técnicas, que farão parte do todo de seu trabalho.

É fundamental que o ator consiga desligar-se de si mesmo, de sua vaidade, de seu ego, que crie espaços vazios e que os preencha com referências advindas de inúmeros canais de criação e, que, neles, nos espaços vazios, possibilite uma nova vida, um novo discurso, com estímulos sólidos, de preferência com as descrições (de si para si mesmo) das sensações, para realmente oferecer algo que interesse tanto ao público quanto e, principalmente, a si.

“A habilidade específica do ator profissional consiste em provocar em si mesmo, sem esforço nem artificialidade perceptíveis, estados emocionais que não pertencem a ele e sim à personagem.”
BROOK, Peter

 
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